Noviça de Requião andou fugida três dias e duas noites na serra, "preferia morrer do que ficar ali"

Carina, 16 anos e natural da ilha da Madeira, fugiu do Convento de Requião e andou escondida pelas serras das imediações "três dias e duas noites a pensar o que fazia". Sem dinheiro, e sem documentos, que teve que entregar assim que chegou à comunidade da Fraternidade Missionária Cristo Jovem, descreveu desta forma o terror pelo qual passou ao longo de quase dois anos: "quando fugi em preferia morrer do que ficar ali". Expôs-se ao perigo de uma área erma e desconhecida, fugindo à estrada, "para não correr o risco de ser levada de volta ao Convento". Temia encontrar a pessoa errada e ser restituída ao local de onde fugira.

A noviça do Convento, hoje com vida reconstruída na Madeira e com três filhos, teve mesmo que ser interrompido a dada altura, uma vez que as memórias do "terror" vivido no Convento de Requião a deixaram perturbada ao ponto de ter que parar para conter o choro. O mesmo já havia acontecido de manhã e no dia anterior com uma outra noviça que, entretanto, regressou à comunidade. Luísa, que foi incansável, assim como a família, na denúncia de alegados maus tratos e privação de liberdade junto da Diocese de Braga, perdeu o equilíbrio quando teve que falar do Arcebispo, Dom Jorge Ortiga, o qual acusou de tudo saber e nada fazer: "o senhor Arcebispo sabe tudo. Nunca fez nada, nunca teve uma atitude, nunca teve uma palavra de conforto. Fui sempre ignorada. Tratou a minha mãe como se fosse lixo. Só quando isto veio para o tribunal é que fez alguma coisa. Mas foi por medo, não por atitude". Perdeu o chão, emocionada, e apelou "não consigo mais, preciso de um intervalo".

De acordo com as duas noviças, a responsável pelos maus tratos de que eram vítimas as noviças era a irmã Arminda. No entanto, ambas assumem que os outros membros da comunidade sabiam o que se passava. Aliás, uma coça de que terá sido vítima Luísa na Capela da Clausura, originou gritos de tal forma estridentes que terão levado o padre Milheiros e a irmã Isabel a dirigir-se para o local. Confrontado com as duas mulheres no interior, Arminda terá dito que estava a castigar a noviça, sendo que nenhum interferiu, abandonando a Capela.

As duas noviças adiantaram ainda que os "castigos", as "chapadas" e os "puxões de cabelo" eram diários, sempre perpetrados por Arminda, que teria o pelouro das jovens. Confirmaram que eram obrigadas a coisas como rezar o terço com as mãos sob os joelhos. "Passeio horas a rezar com as mãos debaixo dos joelhos", descreveu Carina. Ambas dizem que a carga excessiva de trabalho e castigos de que eram vítimas deixaram marcas e sequelas até hoje. 

Os testemunhos foram proferidos em tribunal no âmbito do processo que acusa de nove crimes de escravidão quatro elementos da comunidade, entre os quais o padre Joaquim Milheiros e as irmãs Maria Arminda, Isabel e Joaquina, para além de um representante do Centro Social, indicado pela Diocese de Braga para acompanhar a instituição.

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